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A atividade bancária, na forma em que a conhecemos, está começando a parecer mais ultrapassada que uma impressora matricial.
Na China, os consumidores estão depositando suas poupanças em empresas de Internet, ao invés de bancos. Nas Filipinas, uma classe média emergente paga suas despesas utilizando-se de uma nova cepa de financiadores, baseados em redes sociais. Nos Estados Unidos, um terço dos integrantes da geração nascida a partir de 1980 dizem que esperam usar serviços financeiros baseados em tecnologia, ao invés de bancos. Ao mesmo tempo, 71% afirmam que “prefeririam ir ao dentista, ao que os bancos dizem”.
Greg McBride, analista sênior no Bankrate.com, teria dito, recentemente: “Podem me chamar de ultrapassado, mas para construir riquezas, poupar e investir, você precisará ser parte do sistema financeiro tradicional”. À luz dos fatos mais recentes, esta sentença soa como a de um pai dizendo aos filhos para evitar sexo antes do casamento.
Os bancos são, em essência, dados – montanhas de dados financeiros. Eles trabalharam intensamente, nas últimas décadas, para esvaziar suas próprias agências, por meio da tecnologia. Por isso, para muitos de seus clientes, eles não são mais uma entidade fÃsica. O dinheiro converteu-se em códigos trafegando em redes. A principal vantagem comparativa dos bancos são, hoje, as regulações que mantêm eventuais concorrentes afastados.
Mas mesmo estas regras não poderão proteger os banqueiros por muito tempo. O velho conceito de atividade bancária está sendo atacado por todos os lados, por instituições de novo tipo, que são mais hábeis no manejo de dados e os utilizam de forma mais imaginativa. Há anos, os bancos têm sido vistos, em teoria, como organizações prestes a ser superadas. Mas agora, parece claro como isso pode acontecer.
A superação pode ser disparada pela evolução tecnológica. Fenômenos assim ocorrem, à s vezes, na forma de um colapso catastrófico provocado pela internet – como se deu com os CDs, após o advento da música digital. Mas os bancos podem viver uma experiência diferente – semelhante à lenta corrosão de uma casa infestada por cupins, que em certo ponto atingem, simultaneamente, diversas vigas de sustentação.
Um destes cupins pode ser o Lenddo. É uma empresa norte-americana que opera na Ãsia, utilizando dados, para a atividade bancária, de uma forma que os bancos nunca considerariam. O insight da Lenddo é: os dados sobre quem você conhece, nas redes sociais, e sobre o que estas pessoas dizem de você, são mais precisos que a pontuação estabelecida pelos bancos para calcular se você pagará um empréstimo ou não.
“Por séculos, os empréstimos foram baseados em reputação”, diz Jeff Steward, o executivo-chefe da Lenddo. “As redes sociais permitem retornar a este princÃpio, agora em escala global”. Por enquanto, a Lenddo opera apenas nas Filipinas, México e Colômbia. Nestes paÃses, surgiu uma classe média emergente que, no entanto, não tem acesso a empréstimos bancários. A Lenddo está oferecendo tais financiamentos com base em reputação social, desviando dos bancos uma geração de clientes.
A Lenddo não empresta nos EUA devido à s regulações que favorecem o sistema bancário. “Atuamos nas Filipinas e fazemos empréstimos gastando menos do que custaria obter uma cotação de crédito no estado de Nova York”, diz Steward. Mas num mundo hiperconectado, as finanças são globais. Se a Lenddo e inciativas similares forem bem-sucedidas no mundo em desenvolvimento, isso não repercutirá nos próprios EUA e Europa, por exemplo?
Na China, empresas tecnológicas estão estabelecendo outro precedente. Há menos de um ano, a Alibaba, [maior empresa de comércio eletrônico do mundo], que tem centenas de milhões de usuários, começou a captar suas poupanças, oferecendo taxas de juros mais altas que as dos bancos chineses. Até fevereiro, 81 milhões de pessoas haviam aderido. Há pouco, o Baidu [um similar do Google, chinês], solicitou do governo licença para praticar atividades bancárias.
Por que uma empresa de internet entraria na atividade bancária? A resposta são dados! Nos bastidores, os executivos do Google e Facebook certamente estão observando Alibaba e Baidu, e sonhando em seguir seus exemplos.
Nos EUA, apesar das regulações em favor dos bancos, estes estão sendo obrigados a enfrentar novas iniciativas, que os fustigam nas margens. Seis anos após a crise das hipotecas subprime, os grandes bancos ainda temem emprestar para pequenas empresas, o que cria um enorme contingente de sem-crédito. Issoabriu brecha para um novo tipo de emprestador, como o Dealstruck. Ele usa a internet para conectar gente com poupança disponÃvel a donos de pequenos negócios que precisam de dinheiro. Estes emprestadores alternativos, baseados em tecnologia, estão crescendo muito rapidamente.
Há também as moedas virtuais. Ou o Bitcoin, ou outro sistema de transações digitais, irá explodir, em poucos anos. Exercerá, sobre as bandeiras de cartão de crédito, a mesma pressão que o Skype exerceu entre as empresas de telefonia de longa distância. Ao criar um modo mais simples e mais barato de pagamento, as transações digitais atrairão usuários dos cartões bancários e corroerão rendas vitais para o sistema.
À medida em que novas iniciativas oferecerem maneiras inovadoras de lidar com dinheiro, os bancos não poderão ser resgatados por suas relações com o público. A maior parte das pessoas não conhece melhor os caixas ou gerentes de banco do que conhece os operadores de pedágio. Ao operarem online, os bancos oferecem produtos não-diferenciados, cobram juros, impõem tarifas e fazem o favor de não deixar que nosso dinheiro seja roubado ou perdido.
A nova geração não despejará uma lágrima pelos bancos. Uma pesquisa de três anos, daScratch – a mesma que comparou ir ao dentista com ouvir as instituições financeiras – concluiu que os nascidos entre 1981 e 2000 provocarão mudanças “sÃsmicas” na atividade bancária.
Mesmo a consultoria Accenture afirma que o futuro não parece luminoso para os bancos: “35% do mercado bancário nos EUA poderia ser abocanhado por outras iniciativas até 2020”, diz um relatório da empresa. Segundo ele, 15% do faturamento dos bancos tradicionais poderia migrar para empreendimentos baseados em tecnologia. Os grandes bancos, com todos os seus custos operacionais, pode não suportar os efeitos. Grandes estruturas precisam perder apenas uma ou duas vigas, antes de tremer e entrar em colapso.
Tradução Antonio Martins
A agência Standard & Poors, uma das que fazem classificação de risco de paÃses e empresas, alterou a nota do Brasil para pior: de BBB para BBB-.
E se alguém acha que esse é um debate econômico, está redondamente enganado. A economia continua sendo um assunto importante demais para ficar restrito aos economistas.
A elevação ou o rebaixamento da nota de um paÃs são entendidas, mundo afora, como um sinal do quanto um paÃs é rentável e confiável.
Confiável segundo agências de classificação especializadas em dizer aos grandes financistas internacionais onde investir seu dinheiro para obter maiores lucros, com a garantia de que não tomarão um calote.
A Standard & Poors foi criada no século XIX, nos Estados Unidos, por Henry Varnum Poor, em plena época dos chamados barões ladrões.
Os grandes investidores que Henry Poor avaliava e recomendava ganhavam dinheiro com ferrovias, siderúrgicas e empresas de petróleo.
Uma parte significativa dos lucros desses magnatas vinha da apropriação de terras e outros ativos públicos e da arte de usar e roubar o dinheiro de pequenos investidores desavisados, que depositavam suas economias no nascente mercado de ações.
Esses barões ladrões do século XIX não eram tão diferentes dos mais recentes, que causaram a grande crise financeira de 2008 e 2009. Todos bem recomendados pela Standard & Poors.
A avaliação de risco do Brasil basicamente expressa o quanto o paÃs continua sendo um dos paraÃsos mundiais do rentismo, a mágica de ganhar dinheiro com o trabalho dos outros. Quanto mais a polÃtica econômica de um paÃs é ditada pelos interesses dos rentistas, melhor a nota.
Para não ser rebaixado pelas agências, um paÃs precisa rebaixar sua polÃtica econômica. Tem que seguir uma receita orientada pelo objetivo de fazer crescer o volume de dinheiro movimentado pelas finanças, e não o de fazer crescer o paÃs.
E AINDA TEM GENTE ACHANDO QUE O GRANDE PROBLEMA É A COPA
Se o Brasil sofreu o rebaixamento de um único pontinho, “o que eu tenho a ver com isso?”, pode e deve perguntar o cidadão. Como diria o velho Brecht, tem a ver com o custo de vida, o preço do feijão, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio. Não deveria ter, mas tem.
Para dizer a verdade, esse rebaixamento tem a ver até com a Copa do Mundo de futebol, pois, enquanto tem gente preocupada, com razão, com o custo dos estádios, esqueceram-se do principal.
Para se ter uma ideia: o PaÃs vai gastar cerca de 8 bilhões em estádios. É, de fato, muito dinheiro. Mas o analfabetismo econômico ajuda todo mundo a se esquecer de fazer a conta que importa.
O Brasil gastou, em 2013, R$ 248 bilhões com o pagamento de juros, segundo o Banco Central. Pois bem, dividindo esse valor pelos 365 dias do ano, pagamos mais de R$ 679 milhões por dia.
Vamos comparar com a copa? Dá quase para construir um estádio do Mineirão por dia. Aliás, registre-se que o Mineirão só tem R$11 milhões de dinheiro público envolvido em seu financiamento. O restante será pago pela iniciativa privada. Dois dias de juros da dÃvida pagam mais de um Maracanã.
E ainda tem gente que acha que a Copa é o absurdo dos absurdos do gasto em dinheiro público. É a prova cabal do quanto perdemos a noção das coisas.
Perdemos a noção de grandeza e a de proporção. Com isso, perdemos também o senso crÃtico em relação a esse buraco negro de nossas finanças públicas. Depois, perdemos o foco das prioridades.
Finalmente, erramos o alvo das manifestações. Tem gente malhando o Judas (a Copa, a Fifa) fingindo que está enfrentando o Império Romano. Se não for piada, é teatro.
Quem sabe, um dia, alguém se lembre de escrever a frase em um cartaz: “Cada 1% de aumento na taxa de juros custa R$20 bilhões aos brasileiros”. É uma mensagem mais consistente e valiosa do que “Não é só pelos 20 centavos”.
Vinte bilhões são duas vezes e meia, por ano, o que iremos investir em estádios, que serão pagos em 15 anos em empréstimos ao BNDES – ou seja, dinheiro que voltará aos cofres públicos.
REBAIXAMENTO DO DEBATE ECONÔMICO NOS FEZ PERDER A NOÇÃO
O verdadeiro rebaixamento que o paÃs sofre não é de hoje e não é só o da Standard & Poors. O mais prejudicial de todos é o rebaixamento do debate sobre os rumos da economia do paÃs.
O Brasil continua sendo um carro em que os mecânicos do mercado puxam o freio de mão e culpam o motorista pela dificuldade de acelerar o crescimento, melhorar a infraestrutura e a qualidade do serviço público.
A primeira mudança para uma tomada de consciência é superar a visão de que os juros são um problema só da macroeconomia e que sua conta é paga pelo governo. Não é.
O governo é apenas quem assina o cheque. Quando falamos “o Brasil”, muita gente ainda acha que estamos falando do governo. Perdemos, talvez na ditadura, e ainda não recuperamos a noção de que o Brasil são os brasileiros.
Quem confunde isso com nacionalismo barato e governismo acaba por reproduzir, à s avessas, a velha maneira de pensar ensinada pela própria ditadura. Puro analfabetismo cÃvico.
Quem paga a conta cara dos juros altos são todos os que pagam impostos, principalmente os mais pobres, que, proporcionalmente, pagam mais impostos.
A luta para inverter prioridades precisa convencer milhões de brasileiros de que é preciso virar as finanças públicas de cabeça para baixo.
Hoje, a principal função do Estado brasileiro é pagar juros, os maiores do planeta. O Brasil é um dos três paÃses que mais comprometem recursos públicos com o pagamento de juros, em proporção do PIB, conforme diz até o Fundo Monetário Internacional.
A educação, a saúde, a segurança pública e os investimentos em infraestrutura são pagos com o troco do que sobra do pagamento de juros.
SOMOS EDUCADOS PARA O ANALFABETISMO ECONÔMICO
O problema que temos em mãos lembra o alerta feito por um professor de Matemática, com cara de cientista maluco, chamado John Allen Paulos, em seu livro “O analfabetismo em Matemática e suas consequências" (publicado originalmente em 1988).
O divertido livro de Paulos relembra casos famosos que denunciam a falta nem tanto de habilidade, mas de uso prático e corriqueiro até das operações matemáticas mais simples.
A principal denúncia de Paulos é ao quanto nos desacostumamos da operação mais essencial de todas, não exclusiva da Matémática: pensar sobre os problemas e raciocinar logicamente sobre eles.
Paulos nos avisa que isso é um perigo. Corremos riscos diários com essa nossa preguiça de pensar logicamente sobre os problemas e com a nossa incapacidade de extrair resultados práticos e numéricos dessas operações.
O que acho mais curioso nesse livro, e muito similar ao que acontece em nosso debate econômico, é que esse tipo de analfabetismo é ensinado diariamente.
É como se fôssemos educados para o analfabetismo. Somos treinados a esquecer a lógica dos argumentos e a concordar com coisas que não fazem o menor sentido.
Paulos usa, dentre tantos exemplos, o livro “Viagens de Gulliver”, de Jonathan Swift (1667-1745). O matemático nos mostra como o autor de Gulliver, ao descrever um gigante em uma terra de pequeninos (Lilliput), lascou o livro de grandezas absurdas, que não fazem o menor sentido.
As histórias de Gulliver são de 1726. Para não parecer tão distante, Paulos escreveu, em 1995, “Como um Matemático lê os Jornais”, publicado no Brasil como “As NotÃcias e a Matemática” ou “Como um Matemático lê jornal”.
Acertou na mosca. A imprensa é useira e vezeira em nos deseducar a usar não só os números, mas a lógica. É assim também com as notÃcias cujo tÃtulo é contraditado pelas próprias matérias, armadilha comum aos que leem jornal com o espÃrito crÃtico repimpado e babando no sofá.
TERRORISMO FISCAL, UM ATENTADO AO RACIOCÃNIO LÓGICO
A notÃcia sobre o rebaixamento da nota do Brasil foi uma farra nesse sentido de propagar o analfabetismo econômico.
A conclusão enfiada goela abaixo é a de que o PaÃs precisa aumentar seu rigor fiscal e seu controle sobre a inflação.
Ou seja, o Brasil precisaria urgentemente cortar gastos e continuar elevando sua taxa de juros. Como assim, se o nosso principal gasto extraordinário é com juros? Não faz sentido, faz? Depende pra quem.
A ideia brilhante para atender à s agências de risco é cortar o que o governo faz para pagar mais juros. Faz todo o sentido – para o financismo, não para a maioria dos brasileiros.
Mal começou o ano, os problemas sazonais dos preços dos alimentos, que impactam também os alugueis, são traduzidos na conclusão disparatada e tão absurda quanto os números das “Viagens de Gulliver”.
A lógica é a seguinte: se choveu muito, ou se choveu pouco, a inflação de alimentos elevou-se. Solução: aumentem os juros. Elevando-se os juros, as pessoas vão comer menos alimentos e os agricultores assim plantarão mais alimentos. Com juros mais altos, choverá a quantidade certa, no lugar certo. Entendeu? Nem eu.
O preço do tomate disparou, então o remédio é aumentar os juros. A pessoa irá desistir de levar tomates quando pensar que a taxa Selic está mais alta. Quando a taxa Selic alcança dois dÃgitos, as pessoas trocam a macarronada a bolonhesa por lasanha ao molho branco.
Os alugueis subiram, então os juros precisam aumentar, pois, em Lilliput, a terra de quem pensa pequeno, quando os juros sobem, ao contrário do que ocorre em qualquer lugar do mundo, mais imóveis são construÃdos e os alugueis baixam.
Engraçado, pensávamos que seria o contrário; que, com juros mais baixos, mais pessoas poderiam comprar seus próprios imóveis e se livrar dos alugueis. Aumentaria a própria oferta de imóveis e os aluguéis cairiam. DifÃcil entender os lilliputianos.
Essa falta de parâmetros e de noção do debate econômico causa uma deficiência grave em nossas polÃticas públicas.
Figuras exemplares que alertam sobre isso, como fazem Paulo Kliass, Ladislaw Dowbor e Amir Khair aqui na Carta Maior, há muito tempo, falam de coisas sobre as quais deverÃamos não só prestar mais atenção, mas usar em nosso dia a dia.
Os movimentos sociais precisam se lembrar de explicar essa lógica dos argumentos aos seus militantes.
Precisam fazer as contas de quantos trabalhadores do setor público poderiam ser contratados e pagos com esses valores estratosféricos e escatológicos pagos com juros.
Precisam mostrar para a opinião pública quanto custa o reajuste de salários de suas categorias e compará-los com o que se paga em juros aos banqueiros.
Quem sabe, uma boa ideia seria acampar no gramado em frente ao Banco Central toda vez que ocorre uma reunião do Copom. E por que não fazer pelo menos um dia de luto quando se decreta aumento na taxa de juros.
Imagine todo mundo com a fitinha preta no braço explicando quanto vai nos custar pagar 0,25 ou meio ponto percentual a mais na taxa Selic, e quanto deixará de ser aplicado em prioridades para o paÃs.
Pode até não ajudar a pressionar a decisão do Comitê de PolÃtica Monetária (Copom) do Banco Central, mas, pelo menos, seria um sinal de quantas pessoas terão se livrado do analfabetismo econômico atroz que nos acomete.
(*) Antonio Lassance é cientista polÃtico.
Leia mais sobre o assunto:
> Ladislau Dowbor, em “Os vazamentos do dinheiro público” , mostra que o Brasil não é pobre, mas os recursos são frequentemente mal utilizados, vazando por numerosas brechas, legais ou ilegais, quando poderiam ser produtivos. Â
> O blog do professor Ladislau Dowbor é uma grande biblioteca de Economia, com artigos, livros, vÃdeos, filmes e inúmeros recursos dedicados a trabalhar temas econômicos complexos de forma compreensÃvel.Â
>Um editorial recente da Carta trata do mesmo assunto deste artigo de forma exemplar: “Se pensar pequeno, o governo escorrega na goela conservadora”. Lembra-nos de algo fundamental: que o capitalismo não é apenas um sistema econômico, e sim uma relação de poder.Â
>Jaciara Itaim, “DÃvida pública e juros: coquetel explosivo”, traz o dado de que 1% a mais em juros custa 20 bilhões.Â
>Do economista Amir Khair, "Desafios ao crescimento". Â
>Também de Amir Khair, "Há visões fiscais antagônicas dentro do governo".Â
>Agradeço ao colega e grande economista Paulo Kliass pela orientação sobre alguns números. Os eventuais equÃvocos são de minha inteira responsabilidade e, possivelmente, resquÃcios do meu próprio analfabetismo econômico.
F. Scott Fitzgerald cunhou uma famosa, “Os ricos são diferentes de você e de mim”. Pronunciou-a em uma época, os primeiros anos do século 20, em que os ricos não estavam sujeitos ao escrutÃnio público e em geral eram objeto de inveja, não de ressentimento.
Avançando rapidamente até o século 21, temos o movimento Occupy Wall Street, que, para denunciar a crescente desigualdade social, saiu às ruas em setembro de 2011, no distrito financeiro de Nova York, em nome dos 99% dos norte-americanos que possuem 60% da riqueza nacional frente ao 1% que possui 40%.
Seu êxito repercutiu em todo o mundo; mas agora, os ricos estão contra-atacando.
Seu lÃder é Tom Perkins, de 82 anos de idade, com um patrimônio de 8 bilhões de dólares. É dono de uma cobertura de 1600 m² em São Francisco e acaba de comprar um iate por 110 milhões de dólares. Em uma carta ao Wall Street Journal em janeiro deste ano, Perkins comparou a “guerra progressiva contra o 1% americano” dos estadunidenses mais ricos, com o Holocausto, comparando a “demonização dos ricos” do movimento do Occupy Wall Street com o antisemitismo da Alemanha nazista.
Um mês depois, Perkins declarou publicamente que, nas eleições, o número de votos a que uma pessoa tem direito deve ser proporcional à quantidade de impostos que paga. E está incentivando seus companheiros a “sair do armário”.
Bud Konheim, CEO da empresa de moda de luxo Nicole Milles, fez exatamente isso com sua mensagem aos 99%: parem de reclamar. “Nosso 99% é o 1% do resto do mundo… É quem está ganhando, ó meu deus, 35 mil dólares por ano… Por que não testamos isso na Ãndia ou em alguns paÃses cujo nome sequer sabemos?
Juan Marcos, ex diretor-executivo do banco Morgan Stanley, que foi resgatado com fundos públicos, está defendendo os salários extravagantes dos executivos da corporação. Acaba de fazer uma declaração a favor de James Dimon, o executivo principal do JP Morgan Chase, que recebeu 20 milhões de dólares numa época em que seu banco perdeu vários milhões de dólares, em investimentos equivocados em fundos soberanos, e uma multa de cerca de 12 bilhões de dólares por práticas fraudulentas.
Segundo fontes financeiras, Wall Street gastou 500 milhões de dólares em grupos de pressão, para tratar de impedir a ação das autoridades reguladoras, na aplicação das normas aprovadas pelo congresso dos EUA para um controle um pouco mais estrito. Estas normas buscariam evitar uma repetição da crise financeira de 2008 que, junto com a crise europeia, atirou ao desemprego gerações jovens de quase todas as partes do mundo.
Para aqueles que pensam que na verdade o voto de um milionário é igual ao de um desempregado, este contra-ataque do 1% é legÃtimo. O único problema é que, apesar de seu diferente peso na polÃtica, me pergunto se as mesmas pessoas ingênuas também creem que ricos e pobres pagam impostos na mesma proporção.
Segundo o Tax Justice Network (TJN) — uma organização que faz campanha para frear a evasão fiscal –, nos paraÃsos fiscais encontram-se agora cerca de 8% do PIB mundial (os Estados Unidos têm um PIB de cerca de metade disso). O TJN realça como o grande capital estimula a corrupção.
O que é a corrupção? Segundo o Dicionário Inglês de Oxford, a corrupção é “a falta de honestidade ou conduta fraudulenta por aqueles que têm o poder”. As instituições financeiras e o 1% estão, sem dúvida, no poder. De acordo com a TJN, a quantia subtraÃda dos Estados por sonegação, durante os últimos quinze anos, alcança a assombrosa cifra de 30 trilhões de dólares, o que equivale a metade do produto interno bruto do mundo.
Na China, grande parte dos 4 trilhões de dólares que se acredita que tenham desaparecido entre 2000 e 2011 foram desviados para paraÃsos fiscais. Na Rússia, a cifra é em torno de 1 trilhão de dólares e na União Europeia, 1,2 trilhão.
Em todo o mundo, os bancos foram multados por fraude e corrupção em nÃveis sem precedentes. Ler o informe do Senado dos EUA (2009) sobre o nÃvel de corrupção na UBS, o maior banco da SuÃça, é como entrar no mundo de um romance de crime. O informe, de 176 páginas, detalha em que grau a UBS ajudou seus clientes norte-americanos a esconder muitos bilhões em ativos. A UBS pagou uma multa de 780 milhões de dólares, e pode vir mais.
Num apelo para criar uma força policial contra a corrupção mundial publicado no New York Times, no mês passado, Alexander Lebedev denunciou o roubo de 5 bilhões do Banco de Moscou, 4 bilhões do BTA Bank e Banco AMT, 4 bilhões do Rosukrenergo, 3 bilhões do Globex e Sviaz Bank, 2 bilhões do Banco AgrÃcola Russo, um bilhão do Rosagroleasing e mais um bilhão do VEFK Bank.
Segundo Lebedev, um antigo alto funcionário da KGB e agora empresário, proprietário dos jornais Evening Standarde do The Independent, de Londres, “se alguém rouba um bilhão de dólares, e se dirige a um paraÃso fiscal, é praticamente impossÃvel empreender ações legais”. Como todos os oligarcas russos, ele certamente conhece o sistema por dentro.
De todo modo, não é necessário que o 1% se preocupe. Apesar de suas queixas, os super-ricos estão se dando melhor do que nunca.
Acabo de ler o Informe sobre a Riqueza deste ano, um compêndio anual publicado pela empresa de administração de propriedades Knight Frank.
Durante a última década, o número de super-ricos do mundo cresceu 59%; e o de multimilionários, 80%. Agora, são 1682. Os que têm ativos de mais de 30 milhões de dólares são em torno de 167.000, o que equivale à população de uma cidade de tamanho considerável. Uma recente pesquisa destacou que 75% do famoso 0,1%, os extremamente super-ricos, aumentaram sua riqueza no último ano.
Em torno de 2030, espera-se que a China tenha 322 multimilionários — mais que a Grã Bretanha, Rússia, França e SuÃça juntas: por fim, a prova de que o socialismo, mesmo que em sua versão chinesa, é superior ao capitalismo…
Os paÃses soberanos tomem nota. Malta propõe oferecer seu passaporte aos que paguem 650.000 euros (900.000 dólares), sem requisito de residência. Malta faz parte da União Europeia. Com seu passaporte, pode-se ir a qualquer outra parte da UE. Espanha e Portugal estão oferecendo residência, com tempo limitado, para quem faz investimentos substanciais. Letônia e Estônia estão seguindo-os. Em 2012, os Estados Unidos emitiram 7.641 vistos de investidores e imigrantes e 80% deles foram para investidores chineses.
Portanto, os ricos de verdade são diferentes de você e de mim e estão crescendo tanto, que seria uma lástima não nos unirmos a eles. O mercado é agora a base da democracia, qualquer um pode fazê-lo. Se seguimos fazendo parte dos 99%, é por pura falta de vontade!
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A campanha pelas TTF demanda uma taxa sobre as transações financeiras internacionais – mercados de câmbio, ações e derivativos. Com alíquotas menores que 1%, elas incidirão sobre um volume astronômico de recursos pois esses mercados giram trilhões de dólares por dia.
http://www.outraspalavras.net